Uma Abordagem da Saúde do Trabalhador
Por ocasião do I Seminário Internacional do Amianto: uma Abordagem Sócio-Jurídica, ocorrido em Campinas/SP, houve a discussão da questão do amianto sob o enfoque social e jurídico. Social, diante da necessidade de alertar a sociedade brasileira sobre os riscos do amianto à saúde humana e da viabilidade de substituição da fibra cancerígena por tecnologias ambientalmente menos agressivas; jurídico, porque remanescia a discussão nos Tribunais sobre a constitucionalidade do uso do amianto crisotila no país, a despeito dos compromissos assumidos pela República Federativa do Brasil quando da ratificação das Convenções 139 e 162 da Organização Internacional do Trabalho.
O texto de abertura do website daquele evento iniciava-se da seguinte forma:“O debate sobre o amianto e suas consequências nefastas à saúde humana não é recente e ainda está longe de ser esgotado”. Passados menos de dois anos da realização do I Seminário Internacional do Amianto, é possível afirmar que as discussões em torno da questão evoluíram adequadamente e de maneira muito favorável à defesa da saúde da população, a ponto de, ao menos no plano jurídico, inexistirem dúvidas sobre a inconstitucionalidade do uso do amianto crisotila no nosso país. As recentes decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 3937 e 3406, não deixam margem à dúvida: a questão do amianto foi definitivamente extirpada do mundo jurídico brasileiro.
A afirmação, embora juridicamente válida, muda a vida do trabalhador brasileiro acometido por Doenças Relacionadas ao Amianto – DRA? Como será o acolhimento e o tratamento deste trabalhador nos serviços de saúde? Conseguiremos, finalmente, pôr fim à invisibilidade desses cidadãos, criando sistemas de registro de doenças asbesto-relacionadas? Essas são algumas das questões que sobrevêm na atual conjuntura brasileira: a fase pós-banimento amianto.
A situação incomum vivenciada em nosso país, onde diversas questões, inclusive relacionadas à saúde da população acabam sendo definidas pelo Poder Judiciário, exige uma maior integração entre o mundo jurídico, o universo científico e a realidade social. Contudo, poucos são os espaços onde essa diversidade de saberes podem se encontrar e se integrar. Por essa razão, o II Seminário Internacional do Amianto: uma Abordagem da Saúde do Trabalhador, propõe que as barreiras sejam transpostas, com a aproximação de realidades tão distintas, mas ao mesmo tempo, tão próximas.
O reconhecimento da inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal da lei que permitia a exploração econômica do amianto crisotila enseja celebração, pois é fruto do trabalho incansável dos movimentos sociais e sindicais, que se ergueram e permaneceram firmes desde a década de 1980, a destacar-se a ABREA e o DIESAT, aos quais se agregaram diversos atores sociais ligados à Saúde Pública e Coletiva, além do Ministério Público do Trabalho, os órgãos de classe da Magistratura do Trabalho e dos Procuradores do Trabalho.
Porém, devemos ter a consciência de que ainda há muito por fazer. Dessa fase pós-banimento do amianto, em que consolidamos um olhar multidisciplinar refinado e sensível para a relação entre os processos produtivos e as DRA, fica a responsabilidade de deixar um legado para as próximas gerações, que significa ampliar a percepção para os múltiplos riscos à saúde presentes no mundo do trabalho brasileiro, fortalecendo a certeza de que os esforços coletivos são capazes de realizar a mudança que almejamos ver em todas as dimensões na sociedade brasileira.
Fonte:Brasil sem Amianto