Como trocar o pneu com o carro em
movimento
Numa conversa entre um médico
cardiologista e um mecânico de automóveis este último defende a sua classe
dizendo ao médico: “Doutor, assim como o senhor eu opero uma máquina, eu a
abro, substituo válvulas e tubulações e conserto sistemas que funcionam mal.
Depois de tudo pronto eu fecho e limpo tudo, e a máquina volta a funcionar. Por
que eu ganho menos que o senhor se nós fazemos praticamente a mesma coisa?”.
Imediatamente o cardiologista encerra a conversa: “Tente fazer isso tudo com o
motor funcionando”.
A pequena parábola que acabo de
contar, que não deve ser real, mas bem que poderia, ilustra uma das grandes
dificuldades que muitos gestores têm ao implementar e manter um Sistema de
Gestão em obras de engenharia. O principal argumento é o de que o cenário muda
a cada dia e que, portanto, é impossível acompanhar a velocidade dessas
modificações. Apesar de ser válido, este argumento é incompleto, pois é
possível atenuar os efeitos das mudanças inerentes a um sistema de gestão
dinâmico, incorporando essa característica à forma de gerenciar a empresa.
Aliás, as mudanças são circunstâncias extremamente benéficas a qualquer
empresa, principalmente quando se trata de companhias cujo principal produto é
a mudança, como é o caso das empreiteiras e construtoras. Nesse caso, renega-la
seria reduzir a importância da própria empresa, constituída para provocar e
viabilizar mudanças.
“Isso é muito fácil de falar”, dirá o
indignado gestor de uma empresa de projetos. É verdade. Na vida como ela é, nem
sempre conseguimos pôr em prática a teoria que aprendemos na faculdade, mas é
possível amenizar o nosso sofrimento ao implementar os princípios de gestão que
foram concebidos a priori para empresas estáveis, pouco suscetíveis a mudanças.
Um erro comum é supor que o sistema todo
tem que estar pronto antes do início da obra. O sistema de gestão deve ser
planejado no início da obra. Por exemplo, não é possível realizar um LTCAT
(Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho) antes que todos os
ambientes de trabalho existam efetivamente. Há cargos que somente serão
ocupados no final de uma obra (pintores, por exemplo), e não faz sentido
realizar avaliações em uma condição ainda inexistente. Esta alocação
estapafúrdia de prioridades mina a energia dos gestores, pois gera desgaste
desnecessário e fora de hora.
A fórmula para o sucesso da gestão é
bastante conhecida, quase um mantra da administração empresarial: PLANEJAMENTO.
É necessário planejar a gestão, assim como toda a obra é planejada
exaustivamente antes do seu início. É perfeitamente possível encaixar todas as
ferramentas e práticas da gestão ao cronograma do projeto, principalmente se
supormos que ele será conduzido com base nos conceitos do PMBOK (Project
Management Body of Knowledge), que disciplina as etapas de um projeto,
dividindo-o em cinco fases – ou processos – fundamentais, baseadas no princípio
do PDCA, nas quais é possível desenvolver e alcançar o atendimento a diversos
requisitos do sistema de gestão:
• Iniciação: Este
Processo tem como objetivo entender os requisitos do projeto e preparar as
atividades preliminares para execução do Produto, bem como definir os Objetivos
do Projeto.
• Planejamento: Este
Processo tem como objetivo planejar a execução do projeto considerando
Requisitos do Cliente, Requisitos de Outras Partes Interessadas, Requisitos
Internos e Requisitos Legais Aplicáveis, com ênfase em Escopo, Prazo, Custo,
Objetivos e Metas do SGI. Esta é a fase ideal para a realização da avaliação de
riscos e do levantamento de requisitos legais aplicáveis, pois os controles
operacionais deverão ser determinados antes do início efetivo da execução.
• Execução: Este
Processo tem como objetivo orientar e gerenciar a execução do projeto de acordo
com o planejamento estabelecido com ênfase no atendimento ao Escopo, no
cumprimento do Prazo, no cumprimento do Orçamento Previsto e no Atendimento aos
Objetivos e Metas do SGI.
• Monitoramento
e Controle: Este Processo tem como objetivo monitorar e controlar
todas as fases da execução do projeto de acordo com os requisitos especificados
propondo e acompanhando ações preventivas, corretivas ou de melhoria e
fornecendo subsídios para a análise crítica do desempenho do projeto.
• Encerramento: Este
Processo tem como objetivo realizar o encerramento formal do projeto, através
do registro e comunicação do aprendizado e do arquivamento dos documentos e
registros. Nesta fase o book de documentação (“data book”, no jargão da
engenharia) é finalizado, concentrando todos os documentos relevantes que foram
gerados durante todo o processo de desenvolvimento. A análise crítica dos fatos
que envolveram o empreendimento e o consequente aprendizado a partir desta
análise é fundamental para garantir a necessária, porém difícil, melhoria
contínua.
Uma empresa dinâmica exige um sistema
de gestão com o mesmo nível de dinamismo, e apesar disso parecer complicado,
não há motivos para desespero. No mundo corporativo é possível sim trocar o
pneu com o carro em movimento. Um bom sistema de gestão considera as
necessidades de transformações e se adapta a elas. É fundamental que haja, além
do planejamento, a eterna vigilância, para que os pequenos indícios de mudanças
sejam detectados em tempo oportuno, e que haja pronta reação para manter a
integridade do sistema da empresa.
Flavio Oliveira