segunda-feira, 24 de setembro de 2012
Mais de uma morte acidental de trabalhadores da construção
civil é registrada por dia em canteiros de obras espalhados pelo Brasil,
segundo dados do Ministério da Previdência.
Acidentes recentes chamaram a atenção para o
problema. Nos últimos dois meses, dois operários do Rio de Janeiro foram
atingidos por vergalhões em obras: Eduardo Leite, de 25 anos, teve o crânio
perfurado; em Francisco Barroso, o pedaço de metal atravessou o pescoço ambos
sobreviveram. Em junho, um trabalhador de Brasília morreu ao cair de uma altura
de 30 metros na construção do Estádio Nacional.
Só na cidade de São Paulo, pelo menos oito
trabalhadores morreram este ano, de acordo com o sindicato do setor. No Rio de
Janeiro, foram pelo menos dois casos.
Em todo o país, 438 trabalhadores da construção
civil morreram em acidentes de trabalho em 2010 (dado mais recente disponível).
O setor foi o terceiro que mais matou - a indústria de transformação, que perdeu
648 vidas, está em primeiro lugar. Ao todo, foram 2.712 mortes por acidente de
trabalho naquele ano, segundo dados da Previdência.
E os números podem ser ainda maiores o próprio
governo os considera subestimados, já que só levam em conta funcionários com
carteira assinada e deixam os informais de fora. Na construção civil, os
informais são cerca de 40% da mão de obra, de acordo com o Sindicato da
Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP).
Exército de inválidos
"Estamos criando um exército de inválidos,
com um custo altíssimo para o Estado e para as famílias dessas pessoas",
diz Rubens Curado, gestor nacional do programa Trabalho Seguro, do Tribunal
Superior do Trabalho (TST).
A situação levou o TST a eleger a construção
civil como tema deste ano do programa Trabalho Seguro, que visa aumentar a
conscientização de trabalhadores e empresas sobre a necessidade de adotar
medidas para evitar os acidentes.
A construção civil foi responsável por 56.433
acidentes em 2010, número considerado irracional por Curado e equivalente a 8%
do total verificado no país envolvendo trabalhadores (701.496).
Para Curado, o governo precisa adotar ações
urgentes para reverter esse quadro. Uma delas seria investir na inclusão, nas
escolas, de disciplinas que ensinem as crianças a evitar acidentes.
Boom de obras
O vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do
SindusCon-SP, Haruo Ishikawa, avalia que a alta no investimento na construção
civil nos últimos anos no setor imobiliário e em infraestrutura , teve impacto
também nos acidentes e mortes verificadas no setor.
"O país não estava preparado com
profissionais qualificados para o boom de obras que vimos nos últimos
anos", disse ele.
Segundo Ishikawa, o número de trabalhadores
formais no setor aumentou de 1,5 milhão para 3,5 milhões entre 2006 e 2012, sem
que houvesse aumento proporcional no número de acidentes e mortes.
Ele diz que as empresas de construção investem em
treinamento e conscientização de seus trabalhadores e que os acidentes em obras
acabam chamando a atenção por conta da gravidade e do interesse da imprensa.
Cumprimento de normas
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas
Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon-SP), Antonio de Sousa
Ramalho, diz que o país dispõe de boas normas de segurança que, se respeitadas,
poderiam reduzir os acidentes e mortes nos canteiros.
"Para que isso aconteça, diz ele, seria
necessário aumentar a fiscalização. Não deveria existir acidente. Quando
acontece, é por falta de prevenção e cuidado", diz Ramalho. Aqui em São
Paulo, paramos obras quase todo dia por desrespeito às normas de segurança,
completou.
O procurador do Ministério Público do Trabalho
(MPT) em Brasília Valdir Pereira da Silva concorda que os acidentes são
resultado de falha no cumprimento de normas de segurança. E diz que a situação
só vai mudar com conscientização de trabalhadores, além de fiscalização e
repreensão, inclusive com multas altas contra as empresas, que são as
responsáveis pelo cumprimento das regras.
"A empresa é a responsável pela aplicação
das normas e tem que fiscalizar e cobrar dos seus trabalhadores o cumprimento
delas. Jogar a culpa nos funcionários quando ocorre o acidente, ou alegar que
eles acontecem por conta da baixa escolaridade, é uma visão simplista e
injusta", diz Silva.
Taxa em queda
Procurado pelo G1, o Ministério do Trabalho e
Emprego informou que houve redução na taxa de incidência de acidentes de
trabalho na construção civil, de 11,54 para 9,06 acidentes por mil
trabalhadores entre 2008 e 2010.
No mesmo período, a taxa de mortalidade no setor
caiu de 8,10 mortes por 100 mil trabalhadores, para 7,03 mortes.
O ministério informou que suas fiscalizações em
canteiros de obras aumentaram de 25.706 em 2001 para 31.828 em 2011 e que a
construção civil tem sido a prioridade para os cerca de mil auditores-fiscais
que realizam ações de segurança no trabalho no país.
Os agravos à saúde e à vida do trabalhador não
podem ser resumidos a fatores isolados, especialmente quando se pensa que as
empresas não têm sido fiscalizadas, diz o ministério em nota.
Precisamos destacar é que a proteção à saúde e à
vida dos trabalhadores precisa ser elevada nas empresas, pelo menos, à mesma
importância que a proteção aos lucros.
Segundo o MTE, seu orçamento para 2013 prevê R$
3,1 milhões para Inspeção em Segurança e Saúde no Trabalho e outros R$ 990 mil
para serem aplicados em Auditoria Trabalhista de Obras de Infraestrutura.
Fonte: G1